terça-feira, 30 de abril de 2013

Soneto de Áspera Resignação



David Mourão-Ferreira

Não me digas segredos nessa voz
em que dizes também o que não dizes.
Fica o silêncio ainda mais atroz
depois de entremostradas as raízes.

Prefiro que não digas nada, nada.
Que não sejas arbusto nem canção,
mas sombra entreaberta, recortada
por um lívido e breve coração.

Já que não podes dar-me o que eu sonhara
inteireza de ramos e raízes-,
ao menos dá-me, intacta, a sombra clara

onde se esbatem vultos e perfis.
Pois nessa solidão melhor é ter
a sombra que um segredo de mulher.

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